A onda verde

A eletricidade deixou de ser uma tendência na tração do transporte coletivo feito pelo ônibus para ocupar um lugar de destaque nos próximos anos nos cenários urbanos

Editorial

(Reeditado)

Além de onda verde, também podemos chamar de onda elétrica, pois, ao que tudo indica, a eletricidade movimentará, em um futuro muito próximo, grande parte dos ônibus no transporte coletivo das cidades. Pelo mundo afora, o início de uma mobilização que visa substituir as frotas do veículo movidas a diesel por um modelo limpo de tração é representado por inúmeros exemplos de iniciativas na operação de ônibus movidos a baterias.

Aliás, é bom que se diga que a energia elétrica não é nenhuma novidade para mover o ônibus. Desde o final do século 19, o princípio da tecnologia dos motores elétricos no modal concebeu a primeira versão do trólebus, um modelo conectado à rede aérea que permitiu um transporte livre das emissões poluentes e de ruídos. A seguir, as baterias também surgiram no contexto veicular. Desde sua criação, o trólebus foi adotado no mundo todo, sendo sucesso, principalmente em muitas cidades europeias. O Brasil o conheceu em 1949, sendo São Paulo a primeira cidade a utilizá-lo. Ainda hoje, 200 unidades rodam pela maior cidade latino-americana.

Dos trólebus para os modelos movidos 100% a baterias. Talvez essa evolução seja compreendida pela independência operacional do veículo que não necessita de uma infraestrutura composta por uma rede aérea em seu trajeto, fato que exige investimento, planejamento e manutenção constante. Precisamos lembrar que a bateria também necessita de infraestrutura nas garagens ou em pontos determinados para a recarga, sendo que a rede de energia nestes locais deve ser ampliada, tendo maior capacidade.

Nos planos de desenvolvimento dos atuais ônibus elétricos contemplam-se o uso de tecnologias modernas, como as baterias de lítio ou outros componentes químicos, a recarga rápida delas, além de uma autonomia considerada viável pelas fabricantes, o que proporciona custo operacional otimizado. E os principais nomes da indústria mundial do ônibus, como Alexander Dennis, Mercedes-Benz, Scania, Volvo, Irizar, MAN, Solaris, BYD, New Flyer, Hess, Iveco e Van Hool, estão engajados em projetos e desenvolvimentos que buscam o veículo mais adequado.

Programas governamentais de diversos países já investem nesse tipo de veículo. Cinco grandes cidades alemãs, por exemplo, querem ter cerca de 5.000 ônibus elétricos em operação até o ano de 2030. Isso não para por aí, pois outros municípios da Alemanha seguirão o exemplo e, também, investirão em frotas limpas. A qualidade e a expectativa de vida da população contam muitos pontos nessa transição, devido as leis ambientais cada vez mais restritivas em termos de emissões.  

Também há na América do Norte iniciativas que visam oferecer um transporte eletrificado por meio da adoção de ônibus com tração a baterias. A China é o maior exemplo mundial no uso dessa versão, com mais de 300 mil unidades e ampliando com rapidez sua frota.

A movimentação vista em outros continentes contagiou a América Latina. Santiago, no Chile, mostrou que quer ser líder na eletromobilidade, com a aquisição de quase 1.000 ônibus elétricos a baterias produzidos por marcas chinesas. As cidades colombianas de Medellín e Bogotá seguiram o exemplo e anunciaram investimentos em significativas frotas. Guayaquil (Equador) também comprou sua frota de ônibus elétricos.

São Paulo investiu em sua frota piloto com 15 ônibus para atender uma determinada região da cidade, dando a largada para uma operação que avaliará suas vantagens e a viabilidade técnica. Alguns outros exemplos brasileiros, vistos em cidades como Bauru, Campinas, Uberlândia e Volta Redonda, dão ao País a chance de engatinhar nesse segmento.

Como se vê, a eletricidade é um caminho sem volta e deve predominar nos sistemas urbanos. Os benefícios ambientais promovidos por ela nos ônibus são indiscutíveis, principalmente neste momento em que pesa a necessidade por novos modelos de tração limpa na matriz energética do transporte, em atendimento ao que a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 21) e suas extensões referem-se em termos de redução das emissões poluentes. Nesse mesmo contexto, a lei municipal paulistana n° 16.802 de janeiro de 2018 é um instrumento que visa o estabelecimento de uma política para a operação de ônibus com tração limpa, dentre eles, os veículos elétricos. Se obtiver sucesso, não haverá dúvidas que o mercado brasileiro do transporte se movimentará no sentido da sustentabilidade ambiental.

Porém, algumas perguntas ainda ficam no ar no que tange à operação elétrica. Os trólebus herdaram uma conotação antiga, presa à uma rede aérea, aspecto que exige boa manutenção da infraestrutura e representa uma poluição visual. Porém, tem seu lado positivo alcançado por uma operação eficiente em corredores exclusivos, com pavimento de qualidade, podendo transportar o mesmo número de passageiros que um ônibus versão a diesel.

Já os modelos a baterias são os preferidos por sua flexibilidade. Ganham espaço a cada dia, entretanto ainda precisam apresentar respostas técnicas, principalmente em seus sistemas de armazenamento de energia, bem como de recarga. Todas as montadoras de ônibus estão desenvolvendo novas ferramentas e recursos seguindo esse contexto, com o avanço cada vez mais rápido da tecnologia dos bancos de energia, tornando-os mais eficientes, leves e baratos, fato que permitirá que esta versão de ônibus possa ser ainda mais competitiva em um futuro próximo frente ao trólebus.

Para se ter um exemplo, no desafio de se obter um layout interno dos veículos elétricos capaz de levar mais passageiros, afinal, quanto mais baterias para uma maior autonomia, mais peso ao ônibus e menor o espaço para o passageiro, já existem no mercado as tecnologias de recarga rápida para garagens ou terminais, com os sistemas de pantógrafos ou por wireless, esta última uma inovadora geração de abastecimento de eletricidade, que pode ser instalada no pavimento (pontos de ônibus) das vias, permitindo a redução do número de baterias instaladas nos veículos.   

Este editorial teve acesso à um documento produzido pelo C40 Cities e SPTrans sobre aspectos técnicos e financeiros referentes à frota piloto paulistana. De acordo com o estudo, testes operacionais entre os anos de 2015 e 2018 mostraram que um modelo elétrico consumiu 1,74 kW/h de energia por quilômetro, com custo a R$ 0,89 por quilômetro, enquanto o diesel tem um custo que chega R$ 1,92 o quilômetro. No que tange à frota piloto, compreendendo os meses de dezembro de 2019 a março de 2020, o levantamento comparativo entre as tecnologias das baterias, trólebus e diesel apresentaram os seguintes resultados – consumo energético por quilômetro: 1,62 kW/h, 2,95 kW/h e 0,63 l, respectivamente. Em relação aos custos por quilômetro, R$ 0,729, R$ 1,75 e R$ 1,95, respectivamente.

Outros dados informados no documento relatam preços comparativos entre as tecnologias dos motores elétricos e a diesel, como por exemplo, o valor de aquisição dos veículos, tendo o modelo elétrico um preço de R$ 718 mil (ônibus completo, outubro de 2019) e a versão a diesel de R$ R$ 544.600,00 (ônibus completo, maio de 2018). O valor mais atrativo de ônibus elétrico é em virtude da possibilidade de se alugar as baterias, aspecto que permite essa redução. Assim, em outubro de 2019, o aluguel das mesmas tinha o valor de R$ 9.500,00 (mensal) e o da infraestrutura de recarga de R$ 1.250,00 (mensal).

O que prevalecerá? Talvez uma rede combinada, formada por sistemas exclusivos com trólebus e veículos maiores 100% a baterias operando em corredores de BRT (Trânsito Rápido de Ônibus), que poderão ser alimentados pela sobra de energia dos outros modais, como o metrô e os trens, e outros modelos equipados com baterias sendo utilizados em linhas alimentadoras ou mesmo em áreas centrais das grandes cidades devido as restrições de tombamento de edifícios e/ou centros históricos. A equação financeira devido a racionalização operacional, os contratos com suporte ao investimento e os custos de energia elétrica de cada uma das soluções serão as respostas.

Imagem – Revista AutoBus

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