O princípio para as transformações

O incentivo ao transporte individual e a falta de investimentos ao transporte coletivo por parte do gestor público são aspectos que precisam ser revistos na ordem do dia diante de uma mobilidade urbana crítica e paralisada

Durante o 33° Seminário Nacional da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), muitas foram as propostas para tentar solucionar um mal que convive com os habitantes de diversas cidades brasileiras. O direito de se locomover e a qualidade do transporte coletivo foram temas debatidos dentro do contexto da mobilidade e seus desafios futuros, que já comprometem o presente de muita gente.

O evento, que desta vez foi realizado em Brasília (ano passado foi em São Paulo) e já se tornou uma tradição para quem acompanha o segmento, novamente ressaltou a importância da qualificação do transporte público, principalmente aquele feito pelo ônibus, de maneira a contribuir positivamente com o desenvolvimento sustentável das cidades. Além disso, colocou lenha na fogueira na discussão sobre como recuperar a imagem desgastada do setor, que ano após ano vem perdendo espaço no cenário urbano, frente aos novos desafios impostos pela multiplicidade de modelos de transporte que aí estão.

É de conhecimento que os serviços de ônibus urbanos estão aquém de um nível satisfatório na lógica comercial, sofrendo uma concorrência de diferentes atores do cenário urbano – congestionamentos, aplicativos, automóveis, motos, caminhadas, dentre outras formas. O resultado é que o setor vem perdendo, ano a ano, seu público. De acordo com a NTU, entre 2013 e 2017, 26% dos passageiros deixaram os sistemas de ônibus urbanos em virtude da falta de prioridade operacional, da carência da qualificação e da reduzida velocidade nas viagens.

O incentivo ao transporte individual e a falta de investimentos ao transporte coletivo por parte do gestor público são aspectos que precisam ser revistos na ordem do dia diante de uma mobilidade urbana crítica e paralisada. Criar mecanismos e tratar o assunto com mais seriedade, objetivando a continuidade de projetos e sistemas sustentáveis e racionalizados de ônibus, devem estar no contexto do comprometimento com o meio ambiente e com o planejamento.

Nesse universo de considerações, a NTU, em parceria com a ANTP (Associação Nacional dos Transportes Públicos), desenvolveu um documento chamado “Construindo hoje o amanhã – propostas para o transporte público e a mobilidade urbana sustentável no Brasil”, sugerindo diretrizes capazes de construir um transporte público de boa qualidade, com transparência e preços acessíveis aos passageiros, com metas que podem ser alcançadas com ações estruturantes em nível federal e intervenções específicas adaptadas para municípios e estados. 

Segundo Otávio Cunha, presidente executivo da NTU, são cinco eixos presentes no programa – qualificação da infraestrutura, financiamento do custeio do transporte público, padrões de qualidade, desenvolvimento social e transparência -, itens de extrema importância para a renovação do setor. “A participação do Governo Federal é fundamental para promover os projetos de mobilidade urbana, disponibilizando recursos financeiros para os estados e municípios implantarem seus sistemas de transporte coletivo”, comentou.

Cabe uma ressalva. Muito do que foi prometido em termos de projetos de mobilidade levando em consideração a implantação de uma rede moderna de ônibus urbanos, com o sistema BRT, em várias cidades (para atender os preceitos da Copa do Mundo de futebol de 2014), caiu por terra pela total falta de sintonia dos administradores públicos municipais com o enobrecimento dos serviços.

O evento ainda destacou muitas propostas tecnológicas (desenvolvimento de ferramentas de compartilhamento de serviços, cobrança tarifária, relacionamento com o cliente) para contribuir com as medidas e ações no escopo para as soluções concretas aos problemas causados pela imobilidade. São formas para não deixar o modal ficar para trás neste período de muita evolução, onde o modelo disruptivo tende a dominar o mercado. A NTU ainda ressaltou que quer ser uma central de incentivos na criação de uma rede de inovação para a mobilidade urbana, com o seu programa Coletivo.

Entretanto, arrumar a casa é o primordial junto ao momento tão crítico do segmento de ônibus. Este espaço acredita que, antes de pensarmos em promover uma inovação tecnológica (necessária, sem dúvidas quanto a proporcionar acessibilidade às redes de transporte) é preciso a ascensão dos serviços, com a racionalização dos mesmos por meio da prioridade operacional, concedendo as mínimas condições para que o modal possa fluir (vias exclusivas, pavimento adequado, embarques e desembarques rápidos e prerrogativa em interseções). E, dar velocidade ao ônibus também é possível promover ao modal um conceito de sustentabilidade ambiental, pois quanto menos elem ficar parado no trânsito, menor é o índice de poluição emitido.

Nesta avaliação preliminar sobre o que aconteceu durante o Seminário da NTU, entendo que para o setor recuperar sua imagem também é preciso, antes de tudo, a harmonia entre todas as esferas envolvidas com o transporte público (operador, gestor, passageiros), cada qual com suas responsabilidades e compromissos visando a tão almejada qualificação e melhoria operacional. Vamos aguardar.

Imagem - Revista AutoBus

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